Cassiano Ricardo, foi registrado como Cassiano Ricardo Leite Machado. Poeta imortal pela Academia Brasileira de Letras em 1937, foi também um dos mais destacados jornalistas de sua geração, ainda foi ensaísta e funcionário público com atuação nos governo de São Paulo e federal. Nasceu em São José dos Campos, SP, em 26 de julho de 1894, e faleceu no Rio de Janeiro, RJ, em 14 de janeiro de 1974.
Cassiano era filho mais velho de Francisco Leite Machado e Minervina Ricardo Leite. Teve mais dois irmãos, Vanda e Aristides. Ele foi educado dentro do modelo da aristocracia cafeeira, sua família era rica e produtora de café com fazendas em São José dos Campos e com diversas propriedades na área urbana. Fez os primeiros estudos em sua cidade natal e os completou em Jacareí.
Sob influência de seu tio-avô, Manuelzinho Ricardo, poeta e farmacêutico em São José dos Campos, “Cassianinho”, como era tratado por seus parentes, começou cedo na literatura. Seus primeiros versos foram dentro da escola parnasiana. Aos 16 anos publicava o seu primeiro livro de poesias, Dentro da Noite. Iniciou o curso de Direito em São Paulo, concluindo-o no Rio, em 1917, quando tenta advogar em São José e sem êxito acaba seguindo para São Paulo e depois Vacaria (RS).
Ele teve três livros dentro do parnasianismo e chegou a ser elogiado por Olavo Bilac. Essa fase o acompanha até 1920 e sua obra de transição para o modernismo é “A Mentirosa de Olhos Verdes (1924)”, mesmo ano que retorna para São Paulo e ingressa no movimento modernista.
Com profundos traços nacionalistas tem início dentro da escola moderna com a obra Vamos caçar papagaios (1926); Borrões de verde e amarelo (1927) e o épico brasileiro e que o leva a ter reconhecimento internacional e ingressar no rol dos grandes poetas nacionais, Martim Cererê (1928). Neste livro, Cassiano descreve a formação do povo brasileiro e a saga na constituição do território nacional.
Com sua produção poética em franca ascendência e reconhecida como de alta qualidade, foi um dos líderes do movimento de reforma literária iniciada na Semana de Arte Moderna de 1922, participando ativamente dos grupos "Verde Amarelo" e "Anta", ao lado de Plínio Salgado, Menotti del Picchia, Raul Bopp, Cândido Mota Filho e outros.
Eleito em 9 de setembro de 1937 para a Cadeira nº 31 da Academia Brasileira de Letras, na sucessão de Paulo Setúbal – que lhe havia indicado para ingressar na entidade - foi recebido e empossado em 28 de dezembro de 1937 pelo acadêmico Guilherme de Almeida.
Em 1937 fundou, com Menotti del Picchia e Mota Filho, a "Bandeira", movimento político que se contrapunha ao Integralismo. Dirigiu, àquele tempo, o jornal O Anhangüera, que defendia a ideologia da Bandeira, condensada na fórmula: "Por uma democracia social brasileira, contra as ideologias dissolventes e exóticas."
Sua atuação no jornalismo, que inclusive antecedeu a de literato, apresentou um profissional inovador e dinâmico. Cassiano Ricardo trabalhou no Correio Paulistano (de 1923 a 1930), como redator. Em 1924, fundou a Novíssima, revista literária dedicada à causa dos modernistas e ao intercâmbio cultural pan-americano. Também foi o criador das revistas Planalto (1930) e Invenção (1962).
Mas seu talento se apresentou quando dirigiu o jornal A Manhã, do Rio de Janeiro (de 1941 a 1945). Mesmo sendo órgão oficial do Estado Novo, o jornal que pretendia divulgar as diretrizes propostas pelo regime junto aos leitores dos mais variados perfis, inovou profundamente. A Constituição de 1937, por exemplo, era exposta de forma didática, aparecendo diariamente nas páginas do matutino.
A equipe de jornalistas do jornal foi uma das mais qualificadas da história do jornalismo brasileiro. Nela se encontravam intelectuais de grande projeção e das mais variadas vertentes ideológicas como Múcio Leão, Afonso Arinos de Melo Franco, Cecília Meireles, José Lins do Rego, Ribeiro Couto, Roquete Pinto, Leopoldo Aires, Alceu Amoroso Lima, Oliveira Viana, Djacir Menezes, Umberto Peregrino, Vinicius de Moraes, Eurialo Canabrava e Gilberto Freyre entre diversos outros.
Membro da Academia Paulista de Letras, Cassiano sacode o universo da poesia nacional com o livro “Um Dia Depois do Outro” (1947), depois de longa ausência sem publicar suas poesias. Fundou e foi eleito, em 1950, presidente do Clube da Poesia em São Paulo, foi várias vezes reeleito, tendo instituído, em sua gestão, um curso de Poética e iniciado a publicação da coleção "Novíssimos", destinada a publicar e apresentar valores representativos daquela fase da poesia brasileira. Entre 1953 e 1954, foi chefe do Escritório Comercial do Brasil em Paris para divulgar o café brasileiro.
Participou ativamente dos movimentos do Concretismo e da poesia Práxis, movimentos da poesia de vanguarda nas décadas de 50 e 60. A sua obra Jeremias sem-chorar, de 1964, é bem representativa desta posição de um poeta experimental que veio de bem longe em sua vivência estética e, nesse livro, está em pleno domínio das técnicas gráfico-visuais vanguardistas. Seus estudos continuam no próximo livro, Os Sobreviventes.
Cassiano Ricardo é o único dos modernistas de 22 que passou por todas as fases da poesia enquanto esteve produzindo. Sua obra poética está entre as mais sérias e importantes da literatura brasileira contemporânea. No entanto, também conseguiu destaque como historiador e ensaísta social. Ele publicou em 1940 um livro de grande repercussão, Marcha para Oeste, em que estuda o movimento das entradas e bandeiras.
Cassiano Ricardo pertenceu ao Conselho Federal de Cultura, criado em 1966, foi inspirado no Conselho Federal de Educação e diretamente ligado ao Ministério da Educação e Cultura, no qual conviveu com uma nova geração de intelectuais como Ariano Suassuna, Afonso Arinos, Ariano Suassuna, João Guimarães Rosa, José Cândido de Andrade Muricy, Josué Montello, Otávio de Faria, Pedro Calmon, Rachel de Queiroz, Raymundo de Castro Maia e Roberto Burle Marx.
Seu último livro Dexistência ficou inacabado, mas o acompanhou até suas últimas horas de vida num leito hospitalar no Rio de Janeiro. Por vários anos o destino dos originais foi uma incógnita, até ser localizado numa doação ao acervo da Fundação Cultural Cassiano Ricardo, de São José dos Campos, e publicado em 2010. Desde 1967, por lei municipal, é comemorado em outubro a Semana Cassiano Ricardo na cidade de origem do poeta.
“Como entrei no Modernismo?”
- Não estive presente à instalação da Semana no Municipal em 22, por me achar fora de São Paulo, como tantas vezes tenho esclarecido. O mesmo aconteceu com Tarsila, a nossa grande pintora, que na mesma ocasião se encontrava em Paris. O álibi sem razão, de partida, a indagação que às vezes me fazem, sobre esse ponto. Entrei é verdade, no movimento modernista, porém só achei depois de melhor analisar seus intuitos, causas e concausas emocionais e econômicas. O que fiz foi apoiar o Modernismo, simples e lealmente, dado o seu alto espírito de brasilidade. Nele entrei, de boa fé, como todos os meus companheiros. Apoiar é uma coisa. Aderir é outra. Mesmo porque só participei da revolução literária de 22, de modo mais ativo e até polêmico, como dissidente, já de dois aspectos com os quais não podia concordar:
a) o de haver a Semana começado logo depois dos 7 dias, a importar ‘ismos’ europeus e contra os ideais com que foi inaugurada. Criamos o verdeamarelismo para se opor ao dadaísmo ‘francês’, ao expressionismo ‘alemão’, ao futurismo ‘italiano’ que outros modernistas iam buscar na Europa.
b) o de ser tornado um pretexto para ‘festanças’ e ‘regabofes’ (como declarou o próprio Mário de Andrade no seu opúsculo O Modernismo, p.47) na opulentas fazendas de Paulo Prado e dona Olívia Guedes Penteado.
O Manifesto do grupo Verdeamarelo foi escrito numa das mesas do Café Guarani (Rua 15) e, portanto, opunha-se ao salonismo dos outros grupos. Nasceu não em suculentos banquetes, mas em contacto com o povo. Social mas não mundano. Num simples café e não num salão rico – esclareceu o autor de Martin Cererê.
Foi então que publiquei o meu Vamos Caçar Papagaio, isto é, vamos caçar os macaqueadores empenhados em descobrir o Brasil no próprio Brasil, isto é, no original. Sem figurinos. Alguém poderia supor que eu era xenófobo, e conseqüentemente aderindo ao verdeamarelismo, não estaria aderindo ao integralismo que tinha raízes fascistas? O engano é evidente. O nosso grupo combatia os ‘ismos’ importados – como fiz notar – por uma questão de coerência com as causas que denotaram o movimento contestador de 22. O grito de guerra tinha sido: Chega de copiar. Vamos voltar às raízes do Brasil na sua natureza agreste e nativa. Éramos todos, antes de tudo, radicalmente brasileiros. Foi o verdeamarelismo que trouxe de novo a estudo nomes até então esquecidos, como os de Tavares Bastos, Alberto Torres, Couto de Magalhães, Barbosa Rodrigues, com suas lições magistrais sobre a realidade do nosso País e o papel que o Brasil devia representar no mundo, oferecendo aos outros povos sua palavra de amor ao homem e à terra. Também organizou – prosseguiu – o grupo Verdeamarelo, a nossa primeira ‘brasiliana’, isto é, a primeira coleção de cunho nacional, no domínio da sociologia e da antropologia, Raça de Gigantes; do romance social O Estrangeiro; do ensaio e da pesquisa histórica Introdução ao Pensamento Nacional da poesia tipicamente marcada pela linguagem e cor tropical Borrões de Verde e Amarelo e Chuva de Pedra, antecipando o imaginismo cromático, que Ezra Pound hoje chama de ‘fanopéia’; e o visual cinético também posto em voga como novidade pelo vanguardismo de hoje.
Repelíamos, por isso, o fascínio das idéias e os modismos europeus. A questão era equacionada da seguinte forma: ou sabíamos o que queríamos essencialmente dependendo um programa mínimo ou então pergunto – pra que tanto barulho em 22? A Semana não podia perder altura e força dando um grande salto para trás. Podia?
Queríamos exportar nossa criação literária e artística assim como os jovens brasileiros de hoje (no plano da música, por exemplo) falam em ‘som livre’ e ‘música exportação’.
“Xenófobo, portanto, é que eu não era. Exercia, isto sim vigilância constante para que não merecêssemos o famoso apelo dos escritores franceses chefiados por Benjamim Crenieux na mensagem que nos mandou por intermédio de Renata Almeida. ‘Não nos copieis mais’ – suplicavam. Sede apenas cordiais conosco”.
Veja-se – comentou Cassiano, até os europeus, sem saber, estavam com o grupo verdeamarelo.
Foi este modesto poeta, hoje seu entrevistado, foi quem redigiu, ao lado de Plínio e de Menotti (trabalhávamos os três no ‘Correio Paulistano’) o manifesto verdeamarelo. Outra pergunta curiosa que me tem sido feita: ‘Que tal se surgisse uma nova Semana, já que a literatura nacional está um pouco indecisa? Simplesmente não haveria condições para surgir uma nova Semana – disse Cassiano. E explicou: ‘A Semana de 22 não encerrou ainda o seu ciclo histórico. Nem a literatura brasileira está indecisa. Considere-se que não se pode falar em indecisão quando aparecem romances como os de Guimarães Rosa, Jorge Amado, Mário Palmério, Josué Montello, Otávio de Faria, Maria Alice Barroso, Ariano Suassuna, traduzidos para muitas outras línguas. Os críticos de agora são estudiosos e mestres de alto nível. Aí estão, por exemplo, Euryalo Canabrava, Nelly Novaes Coelho, Oswaldino Marques, Tristão de Atayde, Osmar Pimentel, Fábio Lucas, Antonio Cândido, Nogueira Moutinho, César Leal, Gilberto Mendonça Teles. E os poetas? Drummond (sempre novo), José Paulo Paes, Carlos Nejar, Homero Homem, Walmir Ayala, Mauro Mota, Paulo Mendes Campos, entre os mais presentes à nova problemática compositiva e semântica. Poderia citar muitos outros se não me arriscasse a alguma injustiça’.
- “Que nos diz sobre a poesia de vanguarda? Só lhe posso dar uma resposta informacional. Não sou adesista de nenhuma experiência novidadeira que tenha aparecido. Em todo caso, melhor direi que sou, de fato, interessado sempre no que produzem os de vanguarda. Como sabe o meu caro professor, a vanguarda, em todos os tempos, contém uma fascinante problemática inaugural. Isso já é uma tradição: “la tradition du nouveau” (Rosemberg). Tanto um como outro dos ‘ismos’, a que se refere, foram por mim criticamente estudados em dois ensaios: ‘22 e a Poesia de hoje’ e ‘Praxis e 22’. Não nos esqueçamos que toda revolução artística contém duas etapas principais: a demolidora, polêmica, para derrubar mitos caducos (1ª etapa de 22, por exemplo) e a segunda mais refletida, para um trabalho de reconstrução, ou seja, de permanente e livre pesquisa estética. É a que está em vigência agora. Pesquisa, invenção, visualismo, viagens à sua nova terminologia e outras formas de independência estilística de que o artista necessita para fazer coisa nova e original, no original contexto de hoje”.
(Fonte de Pesquisa do Texto “Depoimento de Cassiano Ricardo”: D.O. Leitura N.º 149, de 13 de outubro de 1994 – São Paulo, págs. 13 e 14 – Matéria: Modernismo – 1922: depoimentos inéditos – Autoria de Luiz Toledo Machado).
1894 – 26 de julho, nasce Cassiano Ricardo Leite, em São José dos Campos – SP, filho de Francisco Leite Machado e Minervina Ricardo Leite;
1902 – Inicia em São José os estudos primários;
1906 – Inicia em Jacareí, São Paulo, os estudos ginasiais no Ginásio Nogueira da Gama;
1907 – Atraído para as letras, fundou, em sua cidade natal, a revista "Íris";
1911 – Funda o Quatro Paus, jornal polêmico com caricaturas de figuras ilustres da cidade, em São José dos Campos;
1913 – Inicia curso de Direito em São Paulo;
1915 – Publica seu primeiro livro de poesia: “Dentro da Noite”. Recebe o Prêmio Azevedo Marques de melhor orador, concedido pela Faculdade de Direito de São Paulo;
1917 – Publica “A Flauta de Pã” – poesia. Conclui o curso de Direito no Rio de Janeiro. Funda em São Paulo a revista Panóplia;
1923 – Inicia seu trabalho como redator no Correio Paulistano. Participa na Revolução, ao lado de Assis Brasil, com os maragatos no Rio Grande do Sul;
1924 – Funda a revista literária “Novíssima”, dedicada à causa dos modernistas e ao intercâmbio cultural pan-americano;
1926 – Funda com Menotti Del Picchia e Plínio Salgado, o movimento Verde-Amarelo, em São Paulo. Publica “Vamos Caçar Papagaios”;
1928 – Divergiu de Plínio Salgado e, com Menotti Del Picchia e Cândido Motta Filho, fundou o Grupo da Bandeira que, embora tivesse objetivo político, se opunha a qualquer ideologia caracterizada como demolidora e exótica. Publica “Martim Cererê” – poesia;
1929 – Casa-se com a poetisa Jaci Gomide Ricardo;
1930 – Deixa o Correio Paulistano. Criador da revista “Planalto”;
1931 – Publica “Deixa Estar Jacaré” – poesia. Torna-se Diretor de Expediente da Secretaria de Estado Negócios do Governo. Diretor-geral da Secretaria do Governo de São Paulo;
1932 - Durante a Revolução Constitucionalista de São Paulo, deflagrada contra o governo federal, Cassiano Ricardo fez discursos radiofônicos na série "Em defesa da revolução", baseados nos poemas de Martim Cererê. Nesta ocasião foi nomeado secretário do governo Pedro de Toledo. Foi preso durante a Revolução Constitucionalista;
1935 – Torna-se novamente secretário de governo;
1936 – Publica “O Brasil no Original” – prosa;
1937 – 9 de Setembro: é eleito membro da Academia Brasileira de Letras – Cadeira nº 31, na sucessão de Paulo Setúbal. Dia 28 de dezembro, foi recebido na Academia por Guilherme de Almeida. Fundou com Menotti Del Picchia e Mota Filho, a “Bandeira”, movimento político que se contrapunha ao integralismo. Dirigiu também o jornal O Anhangüera, que defendia a ideologia da Bandeira, condensada na fórmula: "Por uma democracia social brasileira, contra as ideologias dissolventes e exóticas”. Foi o Relator da Comissão de Poesia, que redigiu parecer concedendo a láurea ao livro Viagem, de Cecília Meireles - primeiro livro da corrente moderna consagrado na Academia;
1938 – Publica “Discurso na Academia Brasileira” e “O Negro na Bandeira” – prosas;
1939 – Publica “A Academia e a Poesia Moderna” e “Pedro Luís Visto Pelos Modernos” – prosas. Torna-se diretor da revista Brasil Novo, do Departamento Nacional de Propaganda (DIP). Em São Paulo funda com Orígenes Lessa a revista Planalto;
1940 – Dirige no Rio de Janeiro o jornal “A Manhã”. Como historiador e ensaísta, publica o livro “Marcha para Oeste”, em que estuda o movimento das entradas e bandeiras;
1943 – Publica “O Sangue das Horas” – poesia, e “A Academia e a Língua Brasileira” – prosas;
1944 – Deixa o jornal A Manhã;
1946 – É eleito Membro da Academia Paulista de Letras, cadeira no. 11, patrono Bartolomeu de Gusmão;
1947 – Publica “Um Dia Depois do Outro” – poesia;
1948 – Criou o Clube da Poesia em São Paulo;
1950 – Publica o livro de poesias: “A Face Perdida” e “Poemas Murais”. É eleito presidente do Clube da Poesia em São Paulo, onde criou curso de Poética e iniciou a publicação da coleção "Novíssimos", destinada a publicar e apresentar valores representativos daquela fase da poesia brasileira;
1951 – Dirige a editora A Noite;
1952 – Publica “Sonetos” – poesia;
1953 – Publica o livro de prosa: “A Poesia na Técnica do Romance”. Foi chefe do Escritório Comercial do Brasil em Paris. O seu livro “Marcha para Oeste” foi traduzido pelo Fondo de Cultura Económica do México, com o título “La Marcha hacia el Oeste”. “Martim Cererê”, do qual Gabriela Mistral já havia traduzido alguns poemas, foi vertido para o castelhano, pela escritora cubana Emília Bernal, e publicado em Madri, pelo Instituto de Cultura Hispânica;
1954 – Deixa a chefia do Escritório Comercial do Brasil em Paris. Publica “O Tratado de Petrópolis” – prosa. É nomeado Diretor-Geral da Secretaria dos Negócios do Governo de São Paulo;
1956 – Publica “João Torto e a Fábula” e “O Arranha-céu de Vidro” – poesias. Recebe o Prêmio Paula Brito, pelo livro O Arranha-céu de Vidro, no Rio de Janeiro;
1957 – Publica “Poesias Completas” – poesias;
1959 – Publica “O Homem Cordial” – prosa;
1960 – Publica “Montanha Russa” e “A Difícil Manhã” – poesias. Recebe o prêmio Jabuti, concedido pela Câmara Brasileira do Livro, pelo livro A Difícil Manhã;
1962 – Publica o livro de prosa: “22 e a Poesia de Hoje”. Cria a revista “Invenção”;
1964 – Publica “Jeremias Sem Chorar” e “Antologia Poética” – poesias, “O Indianismo de Gonçalves Dias” – prosa. Recebe o Prêmio Jorge de Lima, pelo livro Jeremias Sem-Chorar, concedido pela UBE – União Brasileira de Escritores;
1965 – Recebe o Prêmio Juca Pato – Intelectual do Ano, concedido pela UBE – União Brasileira de Escritores. Em São José do Campos é criada a “Semana Cassiano Ricardo”, em homenagem pelo cinqüentenário de vida literária e pelos setenta anos de idade do escritor;
1966 – Publica “Poesia, Práxis e 22” e “Reflexos sobre a Poética de Vanguarda” – prosas;
1967 – Torna-se membro do Conselho Federal de Cultura;
1972 – Recebe o Prêmio Literário de Poesia, concedido na II Bienal Internacional do Livro;
1974 – 14 de janeiro: morre no Rio de Janeiro.
Ao publicar a cartilha conhecendo Cassiano Ricardo na versão digital, a Fundação Cultural de São José dos Campos presta homenagem a seu patrono. Ser FUNDAÇÃO CULTURAL CASSIANO RICARDO, é ter compromisso com o desenvolvimento de nossa cidade, é respeitá-la e amá-la, como ele sempre fez.
E este é o objetivo: fazer com que o joseense conheça a pessoa Cassiano Ricardo. Aquele menino que frequentou a fazenda de café de seu pai área rural de São José dos Campos e pescou nos rios Paraíba e Buquira. Que aos nove anos de idade escreveu seu primeiro jornal, quando estudava no Colégio Olympio Catão e dava os primeiros sinais de sua verve literária.
Com sua sensibilidade, guardou na memória pequenos detalhes dessa infância abastada, numa cidade muito longe da atual, que ainda possuía “pequenas ruas tortas” e um vizinho que “acordava tranqüilo, tocando flauta”.
Embora tenha se mudado para São Paulo, depois para o Rio de Janeiro e até para Paris, as lembranças da então pequena São José dos Campos permaneceram no coração e na poesia de Cassiano Ricardo.
Em reconhecimento e retribuição, temos hoje, neste pólo tecnológico que faz foguetes, carros, aviões e satélites, estampado com orgulho em suas avenidas, escolas, instituições, o nome do poeta CASSIANO RICARDO, na busca do belo, do sonho e da humanidade!
1
Que é a Poesia?
uma ilha
cercada
de palavras
pro todos
os lados.
2
Que é o Poeta?
um homem
que trabalha
com o suor do seu rosto.
Um homem
que tem fome
como qualquer outro
homem.
Cassiano Ricardo
Livro: Jeremias sem chorar
Passageiros, formo como que um diagrama
entre o céu tremido e o jornal que a trepidação do trem sacode
em minhas mãos.
A paisagem me vem oferecer seus buquês roxos e cor de ouro
mas foge, arrependida.
Vistos, de longe, de passagem,
todos os rostos são amigos, são iguais.
Só que depois, em minha memória, que estará rolando ainda esta paisagem
impressa em mim, à minha saudade
o um quadro à parede.
O possível desastre
faz cantar, como uma carretilha ao meu ouvido,
o pássaro do adeus.
O trem de ferro desloca o sentido das coisas.
Viajam as palavras.
Cassiano Ricardo
Em "O sangue das horas"
Viajam as Palavras é o poema que inspirou a Fundação Cultural Cassiano Ricardo a dar o título ao Projeto sobre leitura e literatura que teve início com a Semana Cassiano Ricardo 2005
Depois de tudo
Mas tudo passou tão depressa
Não consigo dormir agora
Nunca o silêncio gritou tanto
Nas ruas da minha memória
Como agarrar líquido o tempo
Que pelos vãos dos dedos flui?
Meu coração é hoje um pássaro
Pousando na árvore que eu fui.
Cassiano Ricardo Leite nasceu em São José dos Campos no dia 26 de julho de 1895, um dia antes de a cidade completar 128 anos. O pai era Francisco Leite Machado, dono da Fazenda Santa Teresa, no bairro da Vargem Grande e a mãe Minervina Ricardo Leite, que além de boa cozinheira escrevia versos e tocava piano.
Na fazenda se plantava muita coisa: café, frutas, legumes, verduras, cana-de-açúcar. Além disso se produzia leite. Seu pai era um rico fazendeiro, o que lhe garantiu uma boa condição de vida.
O menino Cassiano cresceu no meio da natureza. Nas festas juninas comandava as crianças da fazenda e distribuía tarefas: uma pendurava as bandeirinhas, outra ajudava a montar a fogueira, outra ajudava na instalação dos fogos.
A família Leite tinha casa na cidade, na Praça Cônego Lima, onde o poeta nasceu. Décadas mais tarde, o velho poeta percorria as ruas do centro, sempre a noite em suas vindas à cidade, buscando suas lembranças na fachadas dos imponentes prédios que ainda resistiam ao tempo e ao desenvolvimento urbano.
Com mais de 70 anos, o imortal e festejado Cassiano Ricardo, escreveu seu livro autobiográfico “Viagem no tempo e no espaço”. No livro ele conta detalhes de sua infância e da adolescência. E lembra com saudades: “na fazenda aprendi a amar a terra com cheiro de chuva, muito cedo; e o meu gosto era ver as gotas de orvalho, de manhã, presas nas teias de aranha, nas cercas e árvores. Era molhar os pés na relva primaveril”.
Cassiano gostava muito de escrever. Aos nove anos de idade, em 1904, estudando no Colégio Olympio Catão ele fez um jornalzinho chamado “O Ideal”, todo escrito com caneta bico-de-pena, que era o que se usava naquela época. O garoto distribuía o jornal de mão em mão.
Dona Minervina, a mãe, escrevia poesia; o tio Manuel Ricardo era poeta e principal incentivador do sobrinho nas letras; o primo Zezinho Monteiro era jornalista e dono do jornal “A Cidade”. Crescendo nesse ambiente Cassiano Ricardo desenvolveu sua habilidade nas letras.
Quando tinha de cerca de 16 anos, em 1911, começou a escrever um jornal, “4 Paus” impresso na oficina de “A Tribuna”, um jornal que, na época, era do pai dele, Francisco Leite. Logo o “4 Paus” causou confusão porque Cassiano Ricardo criticava algumas pessoas da cidade.
Um dia, um certo doutor Isaac cercou o rapaz na Praça Cônego Lima. O jornal fez uma crítica ao doutor que não gostou nada do comentário e foi tirar satisfações. O jovem Cassiano só não levou uma surra porque populares não deixaram.
Durante toda sua vida, Cassiano Ricardo, advogado formado no Rio de Janeiro, abraçou a profissão de jornalista, tecendo uma das mais importantes carreiras na imprensa nacional em sua época. E ainda esteve envolvido em diversos fatos importantes da história do Brasil.
Imagine só: um menino de dez anos de idade, inteligente, vivendo entre a roça e a cidade, aprendendo sobre a natureza, ao vivo, brincando, convivendo com a família.
Ao mesmo tempo conhecendo todas as novidades do começo do século vinte: eletricidade, automóvel, o cinema, gramofones, vacina contra a raiva, radiodifusão e avião.
Os mais velhos tomavam um susto! Os mais novos ficavam encantados.
Seria mais ou menos o que acontece hoje. Com as crianças convivendo com computador, celular, televisão de tela plana, ônibus espacial, DNA, satélites de comunicação, Internet.
Naquele início do século vinte o garoto Cassiano Ricardo viveu as mudanças todas. Já adulto, o poeta colocou na sua poesia as muitas maravilhas que o acompanharam a vida toda.
O pai de Cassiano Ricardo, Francisco Leite Machado, era de uma família importante de São José dos Campos, inclusive com parentes ocupando cargos na vida política local. Da roça à cidade eram três léguas, mais ou menos dezoito quilômetros em estrada de terra. A viagem era feita em carro de boi, com uma pele estendida por cima para proteger do sol forte.
O centro de São José dos Campos era bem diferente do que é hoje. O Mercado Municipal e a igreja da Matriz ocupavam os mesmos lugares que as edificações de hoje. Mas ambas sofreram alterações com o passar do tempo, inclusive a igreja foi totalmente reconstruída depois que o prédio original ruiu na década de 30. Poucas casas daquela época ainda estão de pé.
Ao lado do Mercado Municipal existia o Largo d’Aparecida, onde todos levavam os animais para beber água. Era neste cenário bucólico que o pequeno Cassiano, nome dado em homenagem a um tio avô do lado materno, passava parte de seus dias.
No famoso poema “A flauta que me roubaram” Cassiano Ricardo se recorda da cidade calma onde passou sua infância. O poema começa: “Era em São José dos Campos...”, cidade de “pequenas ruas tortas”.
Numa parte do texto o poeta lembra do vizinho que “acordava tranqüilo, tocando flauta.”
Esse instrumento musical está sempre presente nos poemas de Cassiano; a flauta lembra a poesia.
Em outro poema ele fala no “vento tocando flauta numa flor”.
E no seu último livro chamado “Os sobreviventes”, Cassiano Ricardo fala de um sabiá que canta na laranjeira. O poeta pergunta ao pássaro: “és tu mesmo/ sabiá vespertino/ ou alguém que toca/ flauta/ em teu lugar/ para enganar/ o menino.”
É o poeta lembrando, numa bela mensagem, a sua infância, os pássaros, os pés de fruta e o seu vizinho flautista.
Depois de terminar o antigo curso primário (hoje é o curso de 1a a 4a série) Cassiano e a família foram morar em Jacareí, onde ele estudou no Ginásio Nogueira da Gama. Nessa escola ele aprendeu o Esperanto que é um idioma inventado pelo médico polonês Ludwig Zamenhoff no século dezenove. Quando a gente presta atenção no jeito de o Cassiano escrever poesia nota alguma coisa do Esperanto, por exemplo, quando ele brinca com as palavras.
De Jacareí sua família foi morar em São Paulo, Cassiano era o filho mais velho de três e ingressaram no curso de Direito e seu irmão, Aristides, no de Medicina. Ali estudou durante três anos. Então aconteceram duas coisas: ele foi para o Rio de Janeiro terminar os estudos e publicou seu primeiro livro de poesia, chamado “Dentro da noite”.
Terminou o curso e voltou para São Paulo como advogado, e tentou montar um escritório em São José. Mas a cidadezinha acanhada não suportaria os anseios de seu filho mais ilustre. Dois anos depois publicou o segundo livro, “A frauta de Pã” que foi bastante elogiado pelos escritores famosos da época: Olavo Bilac, Martins Fontes, João do Rio e Francisca Júlia, a mesma que, hoje, dá o nome para a casa de repouso em São José.
Aos 25 anos de idade, o agora advogado foi morar com a família em Vacaria, Rio Grande do Sul, a convite de parentes. Durante quatro anos Cassiano Ricardo trabalhou em sua nova profissão mas também escreveu o jornal “Pátria”, feito por ele. Começa, então, sua carreira política. E o poeta quase morreu baleado!
O advogado Cassiano foi contratado para defender um homem acusado de assassinato. Uma das testemunhas de acusação era Libório Mafra. Cassiano Ricardo descobriu que Libório havia sido pago pela família do morto para mentir no julgamento. Na hora da audiência ele fez a denúncia ao juiz e o Libório não pôde testemunhar.
Mais tarde, Cassiano estava em sua casa. A mãe, Minervina fritava alguns bolinhos na cozinha. De repente, um tijolo foi tirado da parede e, no buraco, apareceu o cano de um revólver apontando para Cassiano. Era o Libório Mafra querendo matar o advogado! Dona Minervina deu um grito!
Nesse instante, um cachorro da casa vizinha atacou Libório que levou umas mordidas na perna. Foi tudo muito rápido.
O agressor fugiu e o poeta se salvou. Quando escreveu seu livro de memórias Cassiano Ricardo lembrou-se do cachorro: “aquele foi meu amigo, de verdade”.
Em 1923, com 28 anos de idade, Cassiano Ricardo voltou para São Paulo. Um ano antes - 1922 - aconteceu um movimento que mudou a cultura no Brasil: a Semana de Arte Moderna. Todos os participantes queriam escrever, pintar, fazer música - fazer arte - de um jeito diferente, mais... moderno. Cassiano não concordava muito com eles e fez uma outra proposta chamada "movimento verde-amarelo". Ai a briga começou. De um lado, os modernistas, do outro os "verde-amarelos". Os debates foram até publicados em jornais e não se falava em outra coisa.
Mas, o tempo foi passando, as coisas sempre em movimento. Cassiano Ricardo casou-se com a poeta Jacy Gomide e foi convidado para entrar na Academia Paulista de Letras.
Durante as revoluções de 1930 e 1932, das quais participou, o poeta escreveu pouco. Em 1937 entrou para a Academia Brasileira de Letras, onde tomou posse no dia 28 de dezembro. O menino da cidadezinha do interior paulista e jornalista precoce chegou ao ponto máximo da carreira de poeta.
Cassiano Ricardo leu e escreveu muito. Os livros que ele leu e estudou estão, hoje, no Arquivo Público do Municipal de São José dos Campos, doados pela família.
Desde 1915 até 1971 ele escreveu 23 livros de poesia. De 1928 a 1970 escreveu outros 18 livros em prosa, tratando de vários assuntos: história do Brasil, problemas brasileiros, memória, estudos sobre a obra de outros escritores e estudos sobre poesia.
Ele gostava de brincar com as palavras. Dizia que o poeta deve trabalhar o poema, estudar bem o som das palavras. De tanto fazer experiências ele criou o “linossigno” que é o nome de cada uma das linhas do poema.
A vida de Cassiano Ricardo é cheia de acontecimentos ligados à arte, ao jornalismo, à política e, principalmente, à poesia.
Quando escrevia, pensava quase sempre no ser humano sofredor, nas pessoas sem nome. Chamava a atenção para a guerra ( ele vivenciou as duas grandes guerras, particularmente a segunda repercutiu em sua obra literária) e inventava criaturas mágicas nos seus poemas.
Os livros de Cassiano Ricardo foram traduzidos em vários países: Itália, Holanda, Inglaterra, Hungria, Espanha, França. Sua obra é estudada em algumas faculdades nos Estados Unidos.
Aos 70 anos de idade o poeta lembra-se do menino que foi, um dia. Esse menino sempre volta nos poemas que ele escreveu: “tudo quanto tenho escrito se liga ao garoto quem em mim, às vezes, já não sei por onde anda”.
O poeta morreu no dia 15 de janeiro de 1974, depois de anos de saúde debilitada e sofrer uma queda em casa, aos 79 anos de idade. Seu corpo está enterrado no Cemitério São João Batista, no Rio de Janeiro, no Masoleu da Academia Brasileira de Letras.